Aqui nasci e vi Caeté crescer. Acompanhei seus anos de glória e sua derrocada com o fechamento da Companhia. Muitos choraram, sorriram e namoraram perto de mim. Sempre em silêncio cumpri minha função. Eu e minhas companheiras mais novas nos orgulhamos do abrigo e alimento que proporcionamos a tantas criaturas que todo dia nos visitam. Somos testemunhas do nascimento de novos seres todos os anos.
Sei que talvez em virtude da falta de cuidados que as pessoas têm me dispensado, ultimamente pedaços meus lançados ao vento têm incomodado meus vizinhos, mas, nasci e cresci tendo espaço para me expandir e lançar minhas sementes e folhas. Não existiam tantas ruas e casas ao meu redor.
Não é justo que agora depois de tantas décadas seja covardemente assassinada e no meu lugar seja colocada uma outra mais nova, mais forte.
Sinto-me como uma mulher idosa traída e trocada por uma moça mais nova.
Sei que minhas flores lançadas ao chão no fim da primavera, minhas folhas secas e meus galhos velhos e quebradiços incomodam alguns de vocês, mas a fumaça de vossos carros, o barulho de vossos aparelhos eletrônicos também me incomoda.
Não sou do tamanho de uma Serra da Piedade mas se não sou patrimônio de Minas Gerais me sinto patrimônio de cada passarinho ou borboleta que durante décadas e décadas ajudei a preservar.
Não permitam que um abaixo assinado feito pelos moradores da rua decida sobre minha vida ou morte pois todos aqueles animais que dependem de mim infelizmente não sabem escrever para se manifestarem contra tal absurdo.
Não permitam que aconteça comigo e minhas companheiras o que aconteceu com as árvores que ornamentavam a calçada lateral da garagem da Saritur.
Se estivermos fracas, nos adubem. Se estivermos com galhos quebradiços, nos podem.
Quantas décadas levarão para que novas árvores consigam atingir o tamanho e a beleza que possuímos.
Sou grata a este moço, muitas vezes duro e rabugento, que montou um trailer na sombra de meus galhos para vender pastéis, pois através dele estou manifestando meu emocionado apelo:
Por favor não me matem somente porque estou velha e provoco muita sujeira!
Porta voz de uma velha árvore da Rua Pres Kennedy
José Brandão
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